Cerveja e mercado: cervejas além da qualidade ou valor

Richard Westphal Brighenti, beer sommelier, sócio e cervejeiro da Lohn Bier (SC).

O mercado de cervejas só cresce. Por mais desorganizadas que sejam as estatísticas do setor, e
isso não é necessariamente uma crítica, não se pode negar que o segmento continua crescendo
e atraindo novos investimentos.

Talvez já estejamos no momento 2.0, não mais no momento em que estar no lugar e hora certa dará, de forma automática, o êxito do negócio. Quem está no mercado há tempo já entendeu que não basta produzir, é preciso vender — este segundo item muito mais significativo do que o primeiro.

O que quero dizer com este artigo é algo bastante simples. Cervejas boas precisam ter preços não proibitivos. E o setor traz realidade à esta lógica simples. O consumidor é muito sensível ao preço. É verdade, também sou consumidor.

Avaliar custo em uma fábrica requer uma planilha muito grande. Custos variáveis e custos fixos requerem vigilância constante. O ponto de equilíbrio de uma fábrica pode variar de acordo com quão integrada no mercado a cervejaria esteja. Mas este chamado ponto de equilíbrio é sempre bastante alto.

É preciso produzir bastante para tornar viável o negócio. Quanto maior o nível de organização, maior a escala necessita ser, e o ciclo evolui.O âmago do artigo é dizer que o preço da cerveja só faz sentido depois do custo do produto. O custo do produto vai desencadear toda uma conta matemática que passa pela tributação e pela cascata de distribuição até chegar ao consumidor final.

Em um tempo não tão distante, havia um senso comum de trabalhar com margens que variavam entre 30% a 40% do valor para revenda. Não se impressione com tais números, é de longa data essa metodologia. O Custo Brasil embaça ainda mais essas contas. Manter uma empresa aberta é e será sempre um desafio por aqui.

Como se precifica a cerveja? Cada produto tem uma lógica: chope e cerveja, produto mais massificado ou produto menos idealizado no preço, sendo que, neste segundo, o consumidor mede em um critério muito  pessoal se alcança ou não no paladar e no conceito de valor.

Os custos de fabricar a cerveja estão todos lá. De hora de caldeira, responsabilidade técnica, tratamento de efluentes, aluguel de galpão, frete, telefone, água, energia elétrica, conselhos de classe e associações, escritório contábil, controle de pragas, assinatura de periódicos, contratos com empresas de marketing, publicações de forma geral, seguros, empresas de vigilância, manutenção predial, manutenção de equipamentos, limpeza, folha de pagamento e obrigações correlativas, alimentação, sindicatos, softwares, etc. (certamente ficaram itens de fora), além das matérias-primas diretas, como malte, lúpulos, fermento e
água.

Quanto maior a produção, maior a diluição dos custos fixos da operação. Os R$ 0,20 no custo do produto individual na fábrica pode alcançar R$ 2,00 na gôndola ao consumidor. Em escala, isso é uma verdade até um determinado range, mas eu ainda identifico os R$ 0,50 alcançarem os R$ 5,00.

Significa dizer que, quando conseguimos reduzir em R$ 0,20 o custo, poderemos ter na ponta da gôndola uma redução de até R$ 2,00, e o consumidor será entusiasta do produto com preço digno. Para a empresa “pegar de volta”, por exemplo, R$ 0,20, ela precisa calcular R$ 0,20 e mais os tributos desses R$ 0,20 centavos, que estarão calculados como tributos com os tributos dos distribuidores e pontos de venda.

Acredite, os R$ 0,20 podem se tornar R$ 2,00 de verdade, pois, além de somados os tributos, serão recalculadas as margens de trabalho do distribuidor e ponto de venda. Significa dizer que, quando se abstrai um custo de R$ 0,20 de um produto, o preço na gôndola pode ser sensível em até R$ 2,00. Por quê?

Primeiro, é preciso desmistificar, os tributos da produção da cerveja ficam todos (em tese) com a empresa que fabrica. A cervejaria fica de fiel depositária dos tributos. Significa que o governo receberá. O ICMS, ICMS-ST, PIS/Cofins/IPI serão destacados na nota fiscal entre a cervejaria e o primeiro relacionado. Comprar de uma microcervejaria e não pagá-la e tão abominável quanto assaltá-la.

Quem recebe o produto e não salda o seu compromisso revendendo, e o governo, que é passivo, receberão sua parte, abstraindo completamente quem o produziu e que possui margem ínfima. Mesmo observando à distância, não são raras as empresas que visivelmente passam por situações indesejadas por oferecer crédito além das suas possibilidades.

Além da gestão de custos em uma cervejaria, há também um hall de produtos que abstraem a gestão de custos, ao menos como primeiro fator. Fazer produtos hypes, com mais lúpulos do que bolhas, com raspas de chifres de unicórnio e poeira lunar continuará fazendo sentido para o nicho do nicho, mas esses produtos têm um teto. Não são para esses produtos os pensamentos deste artigo, mas valem, em parte, para eles, claro. Seguimos.

Cervejarias e consumidores devem se encontrar, no produto, com qualidade e preços equivalentes. Quem tiver uma equação que compreenda esse significado poderá obter êxito. É um exercício diário fazer diminuir custos.

Obter novos distribuidores, contabilizar adequadamente as entradas, ter boas práticas e equipamentos que aumentem a eficiência e evitem desperdícios, automação, uso adequado da energia, focar melhores oportunidades são apenas exemplos mais plausíveis para administrar reduções.

Que o mercado continue, organizado na bagunça, e que as boas cervejas estejam sempre disponíveis. O papo é chato, mas o objetivo é válido. Saúde!

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