Por Thiago Martini, beer sommelier, juiz BJCP, Certified Beer Server Cicerone e cervejeiro caseiro.
No mundo cervejeiro a Samuel Adams é conhecida como umas das cervejas que revolucionaram o mercado artesanal dos Estados Unidos no início da década de 80. Além disso, para os americanos, Samuel Adams é sinônimo não só de boa cerveja, mas também de coragem em lutar por liberdade e independência.
Samuel Adams foi um dos “sons of liberty”, um grupo conhecido por articular o início da revolução de independência dos Estados Unidos. Os encontros desta turma ocorriam no Green Dragon Tavern, na região central de Boston, regada a muitos pints de cerveja, enquanto questões políticas eram fervorosamente debatidas.
Não só Sam, mas toda a sua família possuía grande prestigio na cidade. Seu pai era um comerciante bem sucedido e proprietário de uma maltaria. Já seu primo, John Adams, foi nada mais nada menos que o segundo presidente americano, sucedendo George Washington.
Justamente por este significado tão simbólico em torno do nome deste ilustre Bostonian que em 1984, Jim Koch, após descobrir uma receita de cerveja de seu bisavô, resolveu produzi-la e batiza-la em homenagem a este imponente personagem histórico. O modelo de negócio foi produzir sob contrato, muito parecido com o modelo de cervejaria cigana no Brasil.
A partir de então, Jim Koch, entrando para o mundo do mercado cervejeiro, resolve libertar os americanos, como ele mesmo se refere, “da cerveja sem graça”, batendo de frente e desafiando a concentração de mercado que estava nas mãos das grandes cervejarias, incluindo a poderosa Anheuser-Busch. Para isso, seu trunfo foi lançar a Boston Lager, uma Amber Lager que trazia algo novo para o paladar do consumidor.
Paralelamente, comprou briga dentro do congresso americano, que foi fundamental para a conquista da reforma tributária que beneficiaria os pequenos produtores de cerveja e, consequentemente, tornando uma vantagem competitiva importante em relação as grandes corporações da época.
Aliás, em um dos festivais de cerveja em Boston, tive a grande satisfação de conhecer pessoalmente Jim Koch, muito simpático e solícito para uma foto de recordação além de ter o prazer de degustar, neste mesmo dia, a famosa Utopias do lote de 2009, uma das cervejas mais alcoólicas do mundo.
Saindo um pouco do escopo histórico e entrando na cerveja propriamente dita, a Samuel Adams é produzida pela Boston Beer Company, nome de registro da empresa. Conta com uma grande estrutura, mas ainda se mantem dentro do conceito definido pelo Brewers Association como cervejaria artesanal independente.
Atualmente, além de Massachusetts, a Boston Beer produz nos Estados de Cincinnati e Ohio. Mas para quem quiser conhecer mais sobre a história da cervejaria, em Boston ainda é o melhor lugar, onde podem ser realizadas visitações guiadas na antiga cervejaria ao sul da cidade, facilmente acessada de metrô.
Mesmo consolidada no mercado, a Samuel Adams não se acomoda, e no final de 2019 Jim Koch surpreende o mundo cervejeiro com o anúncio de um acordo de cooperação com a Dogfish Head Brewery, do seu amigo Sam Calagione, uma junção da segunda maior cervejaria artesanal dos Estados Unidos com a décima terceira.
E não para por aí, pois no início de 2020 foi inaugurado o brewpub junto ao Faneuil Hall, um dos locais mais movimentados e visitados de Boston. Por sua proximidade ao TD Garden, é comum beber alguns pints junto a fãs do Boston Celtics ou do Boston Bruins, pois quase todo dia é dia de jogo. Por fim, acredito que a fórmula de sucesso da Samuel Adams é possuir cervejas dos mais variados estilos e complexidade, aliado a uma boa rede de distribuição, mas nunca esquecendo sua origem e o seu ideal. Grande abraço e boas cervejas.